Nos caminhos do amor, iluminados pelo horizonte da harmonia e da comunhão, que só existem na diferença reconhecida e promovida, muitas são as estações pelas quais o casal realiza, amadurece e expressa seus sentimentos e suas atitudes de amor. Assim, cada estação solicita um jeito singular de amar. Eis, aqui, o sentido da fidelidade, que se faz criativa.
Contrariamente ao sentir do comum dos mortais, que reduz a fidelidade ao não trair, a autenticidade do amor solicita uma ética do cuidado, capaz de construir o jeito de amar, em conformidade com a circunstância do amor, segundo o ritmo e o tempo da pessoa amada. Por isso, a fidelidade deixa de ser vista como um peso, e passa a ser buscada com a alegria de quem vive em verdadeira comunhão, com espírito de discernimento.
A fidelidade torna-se expressão do desejo de quem quer cultivar e viver para a opção feita e cotidianamente renovada. Assim, cultiva-se o sentimento e a atitude de um continuado encantamento. Essa capacidade de, permanentemente, renovar a decisão reforça os vínculos e possibilita a experiência da longevidade do amor.
Com efeito, toda decisão traz em si uma cisão, uma ruptura, que implica morte necessária para outras formas de expressão da vida, em nome da consagração a uma vida querida, projetada e cultivada no cotidiano da existência. Isso implica vigilância de espírito para não construir outros sagrados concorrentes com o assumido, o que acabaria criando um distanciamento e um esfriamento em relação ao projeto inicial.
Com efeito, conforme expressão de Santo Agostinho: “o que move o ser humano não são os seus pés, mas é o seu afeto”. Assim, é preciso sempre verificar o destinatário do nosso afeto, aquilo nos recebe plenamente. Com efeito, o desafio do homem e da mulher, do casal, é ficarem muito atentos para não se deixarem mover por afetos que os conduzam a uma direção contrária ao projeto original.
A dificuldade em conseguir vivenciar essa autentica fidelidade está relacionada com a força da impulsividade egocêntrica e passional do ser humano. Essa capacidade de lutar contra as paixões cegas e desordenadas que constituem a nossa primeira natureza não costuma ser muito cultivada em nossa cultura. Afinal, vivemos em uma sociedade na qual o sacrifício e a renúncia parecem não fazer parte do quadro das virtudes defensáveis, uma vez que o ideal defendido é a liberdade, entendida muito mais como estar desprovido de laços, reduzida uma concepção negativa. Nessa lógica, renunciar a algo prazeroso parece ser destituído de sentido.
Na contramão desse fluxo superficial do reino da banalidade e do espontaneísmo, torna-se imperativa a exigência da criativa fidelidade, como expressão de um amor autêntico, que aprendeu a cuidar.